quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

Análise diferencial: REMESSAS DA EMIGRAÇÃO E SEU IMPACTO NO PIB

REMESSAS DA EMIGRAÇÃO E SEU IMPACTO NO PIB

Segundo relatório publicado pela OCDE, “Cabo Verde, enquanto país de emigração, está colocado em quinto lugar a nível mundial. Que a contribuição da sua emigração na formação do PIB, segundo o mesmo relatório, situa-se na ordem dos 23 por cento, isto é, mais de 23 mil milhões de escudos, que corresponde a três vezes mais ao envelope financeiro do MCA – Milénio Challange Account. A contribuição dos emigrantes representa cerca de 38, 2 por cento da massa monetária do País, sendo 40 por cento dos depósitos a prazos. Em termos gerais, pode dizer-se que os recursos dos emigrantes são, seguramente, um dos suportes da política monetária, sendo activos do Estado, da economia e da Nação”.

1. POR CADA TRÊS CABO-VERDIANOS RESIDENTES, DOIS VIVEM NA EMIGRAÇÃO.

Por cada três cabo-verdianos residentes, dois vivem na emigração. A população residente no País é de cerca de 485 mil pessoas e estima-se que o número de Cabo-verdianos a residir na diáspora totaliza os dois terços da população total cabo-verdiana, atingindo uma cifra potencial de mais 800 mil pessoas, entre emigrantes de primeira geração, seus descendentes (caboverdiano-descendentes) e emigrantes da nova vaga, distribuídos num total de 25 países, numa população total de cerca de 1 milhão e 200 mil habitantes.
A OCDE, analisando o lado das remessas dos emigrantes e do impacto que isso gera na formação do PIB, publicou num relatório recente em que, Cabo Verde, enquanto país de emigração, está colocado em quinto lugar a nível mundial. Que a contribuição da sua emigração na formação do PIB, segundo o mesmo relatório, situa-se na ordem dos 23 por cento, isto é, mais de 23 mil milhões de escudos, que corresponde a três vezes mais ao envelope financeiro do MCA – Milénio Challange Account. A contribuição dos emigrantes representa cerca de 38, 2 por cento da massa monetária do País, sendo 40 por cento dos depósitos a prazos. Em termos gerais, pode dizer-se que os recursos dos emigrantes são, seguramente, um dos suportes da política monetária, sendo activos do Estado, da economia e da Nação. Os recursos dos emigrantes têm uma natureza multipolar para a economia de Cabo Verde, pois: a)- entram para a economia como financiamento a fundo perdido; b)- desempenham um papel importante no aumento das disponibilidades das famílias e no combate à pobreza; c)- apoiam a balança de pagamentos, equilibrando as contas nacionais, dando suporte e sustentabilidade à programação monetária do País.

2. RESPONSABILIDADE DO ESTADO NA GESTÃO E APLICAÇÃO DAS REMESSAS DOS EMIGRANTES.

A trajectória invulgar das remessas dos emigrantes verificada nos últimos anos, que se situa, até meados deste ano, em mais de oito mil milhões de escudos, deveria corresponder não apenas a uma maior possibilidades de créditos à economia, designadamente micro créditos às famílias mais desfavorecidas inaugurando um novo mecanismo de redistribuição de rendimentos e de subsidiariedade, com sistemas de incentivos atraentes, também para os emigrantes e suas famílias, as suas pequenas e médias empresas, mas também maior flexibilidade nas taxas de juros e sobretudo mais atenção do Estado. Com efeito, esses recursos, pela sua natureza, origem e complexidade, reclamam mais responsabilidade do Estado na sua gestão e aplicação, designadamente para: a)- Beneficiar aqueles que não tiveram sucesso no País e tiveram que emigrar e lá fora conseguiram de facto sucesso relativo, prevenindo as gerações; b)- Para aqueles que tendo trabalhado em situação de precariedade em vários Países do Mundo, não puderam usufruir duma pensão de reforma em condições de dignidade; c)- Para aqueles que, tendo sido vítimas de emigração forçada, tendem a ser margilizados nesses Países; d)- Por último, como medida de recurso, para a travagem gradual do fenómeno da emigração que tem trazido custos de oportunidades enormes para o País.

3. A DEFICIENTE ADMINISTRAÇÃO DOS REGIMES DE INCENTIVOS FISCAIS

Não é demais recordar que os emigrantes, esses que colocam recursos à disposição da economia, não residem no País e não têm outra forma de acompanhar a sua boa aplicação se não por via de medidas de políticas e de controle democrático, aliás, única forma de saberem se os seus activos líquidos colocados à disposição do País, estão sendo bem geridos e bem aplicados pelo Estado, não formando qualquer ratio especulativo, no sentido de agravamento do fosso entre os cabo-verdianos, marginalizando as famílias.
Em nossa opinião, a solução, ainda que transitória que se pode adoptar, é aquela que permita caldear a visão que resulta de um certo diagnóstico diferencial feito em relação a cultura das instituições da República, na forma como olham para as questões relacionadas com a emigração e um certo mutismo na gestão do conflito de interesse escondido e o que isso representa para o País. Um dos exemplos mais acabados desse tratamento marginal que é dado aos interesses dos emigrantes pelo Estado e pela Administração Pública, que só se explica por um certo revivalismo e revisionismo ideológicos, espelha-se na forma como se administram os regimes de incentivos fiscais que hoje são concedidos aos emigrantes, designadamente quando se atribuiu chapas verdes às viaturas dos emigrantes que regressam definitivamente ao País. Essas chapas verdes representam uma antinomia económica, despida de quaisquer sentidos de valor.
Tais chapas ou matrículas verdes, como se queira chamar, deveriam ser extintas a breve trecho e substituídas por matriculas normais, pois não têm paralelo em nenhum País da emigração, a adopção dessa regra de excepção, na medida em que o Estado, quando concede incentivos fiscais aos cidadãos, cria, aplica e gera o princípio do direito positivo que, por isso mesmo, não pretende estabelecer limites à natureza transacionavel do bem sobre o qual recai o incentivo, seja ele bem de capital financeiro, seja ele bem de equipamento, à semelhança da isenção fiscal que o Estado concede, e bem, aos investimentos directos estrangeiros (IDE), pelo que ao atribuir uma chapa verde às viaturas dos emigrantes, introduz critérios diferenciados de discriminação negativa, que não se alinham com esse direito positivo e o contributo de estrutura que a emigração dá para a economia, no seu todo, mormente quando se estabelece que o período para que se libertar das referidas viaturas das chapas ou matricula verde é coincidente com o período de amortização económica da viatura, o que procede à sua ilegítima desvalorização.

4. NECESSIDADE DE MAIOR FISCALIZAÇÃO DOS INCENTIVOS FISCAIS

O Estado, sentindo-se na obrigação de conceder incentivos fiscais aos não residentes por razoes de medidas de politicas, deve, aumentando a sua capacidade de fiscalização, permitir que o emigrante que trouxer a sua viatura e que regresse definitivamente ao País, possa transaccioná-la no tempo e no momento em que esse bem tem valor económico, podendo, com isso, gerar mais valias económicas e financiar o custo do seu regresso definitivo ao País. Parecia ser esse o espírito do legislador ao decidir adoptar medidas de politicas, isentando as viaturas dos emigrantes que quisessem regressar definitivamente ao País. É de difícil compreensão a insistência do Estado e da Administração Pública na aplicação dessa medida que coloca o cidadão emigrante frente a frente com os serviços alfandegários, que aplicam a medida, num confronto sistemático directo com os emigrantes, fazendo com que esses tenham de procurar vias alternativas que contrastam com o dever do Serviço em cobrar mais e mais recursos para o Estado e a obrigação desses mesmos Serviços em servir os cidadãos, independentemente da sua residência, e condição social.

5. O ESTADO DEVE FAZER JUSTIÇA SOCIAL

O Estado não pode servir-se das contribuições líquidas dos emigrantes e negar-lhes contrapartidas reais, designadamente desagravando a pressão alfandegária que recai sobre eles, fiscalizando e reduzindo a possibilidade de corrupção, mas adoptando medidas de politicas que visam defender o interesse geral, que decorre desse subsector, por isso, em sede do Orçamento, não é demais exigir que devendo o Estado aumentar a fiscalização para eventuais fraudes e combater todas e quaisquer formas de evasão fiscal, adopte medidas que desagravem o imposto que recai sobre as viaturas dos emigrantes, com idade superior a 10 anos, com vista a facilitar aquele emigrante que, estando em idade de reforma e não querendo viver mais na emigração, regresse definitivamente ao País, trazendo o que tem, incluindo a sua viatura que, para muitos pode ser viatura velha, mas que para ele representa o seu bem, e o que naquele momento efectivamente tem e tem dele o direito natural de usufruto. Com esta medida estaria o Estado a fazer justiça social e a beneficiar as famílias, cujos membros emigrados não tiveram sucesso, vivam e sobrevivam no limiar da pobreza relativa.

Miguel Cruz Sousa - Deputado da Na

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