domingo, 10 de agosto de 2008

SINTOMAS DE UM GOVERNO DE FIM DE CICLO: GOVERNO DE JMN FALHA NA GOVERNAÇÃO

Este governo ao mostrar ser insensível à busca permanente de consensos em matérias de interesse nacional, de regime e de desenvolvimento do País, para criar condições na sociedade que permitam debater grandes temas como: a) a estabilidade demográfica e o processo de desenvolvimento (sustentável) centrado na pessoa humana; b) a redução do deficit de confiança dos cidadãos no País, como objectivo estratégico primordial; c) a problemática do emprego e o crescimento económico inclusivo que gera emprego e que reduza a pobreza; enfim, um tuplo estratégico que reflicta essa capacidade de planeamento que naturalmente se exige dos governos e que fazem com que os governos cumpram na integra o seu programa eleitoral, vai caminhando a passos largos para fim-de-ciclo; e por ter vindo a insistir em objectivos de curto prazo, vai matando a possibilidade de mobilizar a sociedade e um governo que falha na mobilização da sociedade para levá-la a cumprir metas fundamentais para a sua estabilidade emocional, falha na governação.

Hoje, em Cabo Verde, o ambiente socio-económico é caracterizado por incertezas. O desemprego elevado (21,7%), a inflação em alta (5,7%), exigiria do governo politicas activas de emprego e que o mesmo, enquanto objectivo, fosse prioridade nacional. Corresponderia, no mínimo, ao esforço adicional para se travar o risco de rupturas sociais a nível da juventude, perante o desemprego que grassa entre os jovens e ascende a um valor próximo dos 42%.

A realidade de desemprego elevado nas camadas de juventude, comete grandes responsabilidades ao governo, à sociedade e à própria juventude, no sentido restrito do termo. A juventude não pode delegar as suas responsabilidades na construção de alternativas politicas a um governo que não lhes oferece um futuro. A batalha do emprego, sendo batalha de toda sociedade, é, inevitavelmente, uma batalha da juventude.

Como tal, a politica de emprego – (a empregabilidade) – deveria ser desafio fundamental e prioritário da sociedade, pois traduz exigência actual global da Nação. Como governar é optar, não pode o governo deixar de assumir as suas responsabilidades decorrentes das fragilidades das suas opções em matéria de emprego e da empregabilidade da economia. Não desenvolvendo politicas públicas a favor do emprego, que respondam aos desafio decorrentes das necessidades dos jovens – a parte mais nobre desse fenómeno de massa que é a mobilidade social em Cabo Verde – o governo irrompe-se em falhanço. E é sintomático.

Sabe-se, por outro lado, que o desemprego, em Cabo Verde, é estrutural, embora não sendo resultado exclusivo de ausência de liquidez económico, no sentido restrito do termo. Em certa medida o desemprego é provocado pela rigidez nos mecanismos de acesso, disponibilização e instalação do capital reprodutivo e pela fraca capacidade do sector privado em dinamizar o emprego, por ausência de incentivos públicos. Por outro lado, é sabido que a sociedade cabo-verdiana é marcada por ausências de incentivos que facultem meios líquidos ao nacionais para que, em igualdades de circunstâncias, com os investidores estrangeiros, possam também investir no seu próprio pais.

Acresce-se como dado para reflexão uma outra nota importante que parece situar-se na origem do problema: o facto da liquidez existente na economia, não resultar da função produção/interna, mas sim, em grande medida, de transferências líquidas do exterior, ora em forma de remessas dos emigrantes, ora em forma de ajuda orçamental, ora, ainda, em forma de exportações de serviços a partir de turismo.

Existem fundadas razões para que se considere que a causa do facto da economia crescer e não gerar empregos repousar no diferencial em ponto percentual existente entre o crescimento real (que parece situar-se abaixo do crescimento potencial do Pais) e o crescimento nominal estimado resultar das mais valias e transferências liquidas do exterior e não da produtividade da economia, agravado pelo efeito subsidiário da reciclagem da ajuda orçamental, distribuída de forma inverosímil, através de programas tipos como luta contra pobreza e operação esperança.

Mesmo em países desenvolvidos, quando uma economia incorpora liquidez do exterior, tende a baixar a produtividade. O emprego não resulta da magia, só é gerado quando a produtividade se incrementa. Aqui, em Cabo Verde, vemos nas ruas que o que circula na economia real não resulta da capacidade produtiva interna instalada da economia.

Por isso, têm razão aqueles que defendem que crescimento económico que não se baseie no consumo não é sustentável a médio prazo. Alias, Francisco Tavares (ex-presidente do INE e actual Presidente da Câmara de Santa Catarina) tem vindo a chamar atenção que, em Cabo Verde, o crescimento do PIB abaixo de 6% não gera emprego, pois a economia cabo-verdiana para gerar emprego tem de crescer acima do seu potencial, e se o crescimento potencial de Cabo Verde rondar os 6% significa que abaixo de 6% há perca de emprego. Iguais a 6% matém o status-quo. E só quando cresce acima dos 6%, num ambiente de liberdade e de livre concurso dos factores de produção, do acesso ao capital reprodutivo por parte dos agentes económicos, bem regulado e sem especulações, pode a economia gerar novos postos de trabalho.

Para Cabo Verde é essencial compreender o fenómeno da empregabilidade. Que implica compreender o efeito dos baixos salários. Que implica compreender a necessidade de se redefinir a idade de reforma, numa perspectiva da sua diminuição para níveis compatíveis com as exigências de uma população jovem. Que implica compreender, liberalizar e flexibilizar o mercado laboral e assumir a hora laboral, como base da relação entre o capital e o trabalho e base da produtividade. Que implica estabelecer um salário mínimo nacional como instrumento de reforma e regulação do acesso de rendimento, do mercado laboral, da sustentabilidade do nosso sistema educativo e da atribuição de um valor de referência à fbcf gerada pela economia; Implica adoptar a agenda para o trabalho decente numa economia onde mais de 62% de rendimento das famílias provém do trabalho. Onde a educação de base, a formação e qualificação profissionais são consideradas elemento nuclear para a mobilidade social das pessoas.

A situação actual não permite reduzir incertezas e, concomitantemente, exigiria, não um governo de segundo tipo como exprimida na última remodelação governamental, mas sim um Governo capaz de ser um governo de todos. Disponível para governar o Pais. Que procura construir as opções de longo prazo e que dê atenção à juventude. Que não se cansa em trabalhar os grandes consensos nacionais: portanto credível, com vontade politica. Que se posiciona ao lado das soluções e não dos problemas. Capaz de mobilizar a Nação, tanto para o crescimento da economia – trabalhando a felicidade geral - como para enfrentar situações de crise.

Miguel Sousa (Deputado da Nação)

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

A NOSSA POLITICA EXTERNA DEVE TORNAR-SE ACESSÍVEL À SOCIEDADE CIVIL

A NOSSA POLITICA EXTERNA DEVE TORNAR-SE ACESSÍVEL À SOCIEDADE CIVIL



A área de governo relativa à Política Externa do Estado de Cabo Verde e sobre a Emigração está marcada por uma excessiva governamentalização das políticas públicas desenvolvidas ou implementadas no sector. Ela deveria ser encarada de forma plural e diversificada, susceptível de gerar cumplicidades e parceiras, não devendo ser única e exclusivamente assunto do Governo, mas sim da sociedade civil, das Câmaras Municipais, das ONG’s, da diáspora cabo-verdiana e do Parlamento.

Na medida em que não existem politicas específicas e claras nem para a diáspora Cabo-verdiana residente na Europa e nos Estados Unidos, nem para as nossas diásporas residentes na Guiné-Bissau, Senegal, S. Tomé e Príncipe, Angola e Moçambique, o país vai navegando à vista nesse domínio. Arma-se para mobilizar ajudas, de preferência que seja ajuda orçamental. Centraliza essas mesmas ajudas e depois com esses recursos promove associações comunitárias, desenvolvendo um poder local paralelo, em prejuízo das populações.

Temos que dizer aos parceiros que nos concedem essas ajudas, que devem exigir do Governo de Cabo Verde, ao Sr. Primeiro Ministro e Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, maior democracia na gestão dessas ajudas e na sua afectação às necessidades das populações, devendo envolver as Câmaras Municipais, para que tais ajudas possam chegar às populações e estimular o emprego, a economia real e reduzir as desigualdades sociais e regionais: importa arrepiar caminhos, importa encontrar um paradigma, diplomaticamente, aceite mais produtivo, mais dinâmico, mais democrático, no fundo mais consentânea com as exigências da Nação.

A nossa condição de sujeito útil no concerto das nações depende em grande medida da credibilidade da nossa imagem externa, que deve ser construída pela via da coerência, da previsibilidade, da legitimidade, de partilha de informações. A nossa politica externa deve, assim, tornar-se acessível a sociedade civil, mais plural, e não pode emergir-se de um secretismo latente.

A forma como as politicas publicas são desenvolvidas no sector da Política Externa e emigração relembra-nos, permitam-nos, essa comparação, a narrativa da política externa desenvolvida e praticada nos primeiros quinze anos de independência nacional, nos primórdios de partido único, onde tudo era confidencial, pouco democrático e segredo de Estado.

Ora, hoje as coisas não podem ser assim.

Nessa altura, como agora, a politica externa pecaria por não enquadrar as legitimas prioridades da Nação e dos cidadãos. Nessa altura, como agora, pecaria por ignorar e não incorporar a ideia estratégica fundamental da Nação – a de ser uma Nação do atlântico médio, mestiça, lusófona e cabo-verdiana, livre e democrática, com vontade de vencer os muitos desafios que se nos impõem. Nessa altura como agora a politica externa centrava-se na excessiva dimensão multilaral externa do Estado, com fraco impacte bilateral, caminho através do qual, normalmente, os povos se relacionam.

Saibam a Nação e os cidadãos cabo-verdianos espalhados nos quatro cantos do mundo, que o Governo tem vindo a negociar e a celebrar um conjunto de acordos internacionais, ora com a União Europeia, ora com a OMC, ora de suporte a transição para PDM, mas a Nação não sente que esses acordos estão sendo traduzidos em projectos concretos com implicações concretas na melhoria das condições de vida dos cidadãos e das populações. Os cidadãos ficam cada dia convencidos de que esses acordos traduzem uma opção do Estado, que como no passado, nem sempre coincidem com as opções dos cidadãos e com as prioridades do pais e da Nação.

Aqui no país, convêm dizer, lideram o desemprego, as desigualdades sociais, a insegurança, os baixos salários, o reordenamento das populações em ordem às diferenciações provocadas pela má distribuição de riqueza, e, em consequência disso, existem riscos fundados de rupturas sociais, de consequências imprevisíveis. Na diáspora reinam a perseguição, a descriminação, a precariedade laboral, o desemprego, a xenofobia e descriminação, a prisão arbitrária dos Cabo-verdianos e a indiferença do governo de Cabo Verde; reinam a dupla exclusão no real sentido do termo, no pais de acolhimento e no pais que viu nascer os mais de 900 mil Cabo-verdianos que vivem e trabalham em mais de 25 países espalhados pelo mundo.

Nos primeiros quinze anos de independência foi assim: celebravam-se acordos internacionais nas costas das populações, sem que esses mesmos acordos passassem pelo crivo democrático. Hoje, a politica externa tende a reproduzir os mesmos valores, tende a maximizar as mesmas variáveis.

O país sabe que foi graduado para PDM, para País de Desenvolvimento Médio, mas a Nação desconhece os seus efeitos, porque o Governo não informa as populações, guarda secretamente os objectivos e as responsabilidades decorrentes dessa graduação, porque excede na sua governamentalização. Importa mudar de paradigma.

O país assinou o Acordo de parceria especial com a União Europeia, mas o governo guarda a sete chaves o objecto desse Acordo e a nação desconhece o sentido do Acordo, e não sabe quais são as implicações e responsabilidades dos Cabo-verdianos perante esse acordo, nem os Cabo-verdianos residentes no país nem os da diáspora, mormente os que residem na Europa.

O país íntegra a OMC, mas os agentes económicos, as famílias e as empresas e o próprio Estado e sua administração pública desconhecem completamente as implicações materiais resultantes do facto de Cabo Verde passar a ser membro de pleno direito da OMC: tudo é segredo de Estado e é secreto.

Com este Governo tudo é secreto, no plano dos negócios estrangeiros e emigração. O pais é ostensivamente surpreendido com uma enorme exposição externa, transportando riscos para o seus cidadãos em vários domínios, reflectidos, como se pode verificar no aumento do risco soberano do país para o sector energético, com graves consequências na mobilização de parcerias externas, e na incapacidade interna do governo em prevenir choque externos, na incapacidade do Governo em promover um desenvolvimento harmonioso do pais, baseado num novo modelo, num tipo de crescimento com qualidade e equidade sociais, geradores de empregos; nas questões de segurança e no papel de Cabo Verde no mundo.

Aqui também se pode descrever as responsabilidades da política externa em fornecer ao país elementos de planeamento estratégicos, consentâneos com as mudanças que ocorrem no mundo, ou que se presumem estarem em consonância com as opções de politica interna e traduzem as expectativas dos cidadãos Cabo-verdianos, as populações e da Nação. Nada disso acontece e de repente ocorre uma remodelação e muda o ministro.

Na gíria, quando se remodela o Ministro dos Negócios Estrangeiros ou se muda Embaixadores diz-se que se está a proceder uma reorientação diplomática. Diz-se que se está a proceder uma viragem de forma, pelo que se torna legitimo perguntar ao Governo o que é que falhou, se como disse o Sr. Primeiro-ministro Cabo Verde está em alta em termos de notoriedade externa e internacional, no sector da política externa e comunidades porque que ele troca de Ministro. Se existe mudança de forma qual é a profundidade dessa mudança e qual é o sentido dessa viragem, para que a Nação possa tomar boa nota e esteja prevenida e possa acompanhar, mais este segredo de Estado, que nem o Parlamento e os deputados podem descortinar e acompanhar?

As opções estratégicas e tácticas de Cabo Verde no plano global tem que envolver a Nação, por isso deve ultrapassar os limites das responsabilidades do Governo e resultar de consultas sistematizadas do Governo com os diferentes partidos políticos e a sociedade civil. A excessiva governamentalização de uma Politica Externa que se pretende secreta prejudica os interesses da Nação a longo prazo. Uma visão de politica externa restritiva que não tenha por base esses elementos, pode falhar no futuro, como aconteceu em relação a muitas opções assumidas durante o tempo de partido único. Exige-se, pois, uma politica externa construída na dupla perspectiva, por um lado virada para as questões de índole estratégicas da Nação, que reflicta a unidade nacional e os interesses vitais da Nação e por outro lado capaz de seduzir novos parceiros e colocar o interesse nacional acima de quaisquer outros interesses conjunturais, e reduzir os riscos de uma exposição ostensiva, muitas vezes sem efeitos de curto, médio e longo para prazo para um “micro Estado”.

Esta prudência não tem vindo a acontecer de forma clara em vários domínios, envolvendo as unidades orgânicas do Estado com responsabilidades no sector, designadamente nos consulados, que não cumprem com a simples transcrições atempadas de nascimento de milhares de Cabo-verdianos na diáspora, dificultando e perigando a sua futura participação política. Num Instituto as Comunidades que deixou de ter razões de ser e não cumpre as missões para que fora criada; numa tendência que ainda prevalece de partidarização das Embaixadas e Consulados; Numa alfândega indiferente e insensível a transacção dos Cabo-verdianos da diáspora com o país.

Os Cabo-verdianos residentes no país e na diáspora, e concretamente os que residem na Europa, questionam inclusivamente porquê que o Governo assina o acordo de parceira especial com União Europeia, ensaia acordos de emigração circular, fala da parceria para a mobilidade, quando, por um lado, não leva em consideração os milhares de trabalhadores cabo-verdianos que vivem na Europa em situação irregular; quando não conseguiu garantir a mobilidade profissional dos Cabo-verdianos a nível interno, nos países da União, quando alguns desses países não ratificam o acordo de segurança social com Cabo Verde, onde os Cabo-verdianos com pensão de reforma possam ter assistência médica e medicamentosa ao regressarem definitivamente ao país.

Os activos políticos estratégicos acumulados nos últimos 33 anos de independência e desses quase 18 anos de liberdade e de democracia não podem ser manobrados no plano externo a favor do governo, têm de ser reorientados a favor do país e a favor de toda Nação, envolvendo a parte que reside no território nacional e a parte diasporizada.

Miguel Cruz Sousa, Deputado da Nação